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Writer's pictureFrancisco Capelo

Os 5 receios do adulto na Arte

Updated: Sep 10, 2019



O adulto, a criança e a arte


Todos os adultos a quem é proposta a realização de uma obra de arte passam por um sentimento geral de ansiedade, que é constituído por cinco fases; cinco receios cuja escala de importância é crescente.



Estes são os 5 receios do adulto quando confrontado com a linguagem subjectiva da arte:



. Medo 1. Medo de parecer infantil


Escapar a este receio é simples: basta entrar no jogo. Mesmo que pareça um jogo infantil, há que jogá-lo. Quando fazemos um desafio criativo a uma criança, ela corre a aceitá-lo e a entrar nesse desafio de cabeça, sem pensar – intuitivamente.


Mas o adulto, talvez por pensar demais, e por pensar de forma demasiado racional, tem tendência a um comportamento mais defensivo. Defende a sua própria personalidade de uma previsível humilhação, através da resposta também ela a mais previsível: a negação. Ao se recusar a entrar no desafio criativo – ou o jogo – o adulto revela as camadas de protecção social de que se rodeou, ao longo do seu crescimento.


Mas também há outra forma de escapar a este receio: ir além do desafio, não apenas entrar no jogo mas alterar as suas regras e ir mais longe nos seus objectivos.

Esta seria uma resposta – ela sim – à altura da coragem intuitiva da criança…



. Medo 2. Medo de não ter nada para expressar


Este receio é bem real, e não convém portanto menosprezá-lo. No entanto, e falando aqui da minha experiência recente como formador de artes plásticas, os adultos têm escondida dentro de si uma vocação artística evidente, e quanto mais hesitam, normalmente mais têm para expressar, com grande qualidade de conteúdos. É, neste sentido, um receio de bases pouco fundamentadas. Ao começar existe um outro receio: o da ligação à linha – e por isso os artistas iniciantes dedicam-se de alma e coração às cores. Porque este é um terreno mais pacífico. Porque quando se trabalha com linha, é necessária uma reinterpretação da realidade que exige esforço de grande profundidade intelectual mas sobretudo emocional.


Mas voltando ao receio inicial: não há qualquer hipótese de o adulto nada ter de próprio para desenhar ou pintar ou esculpir: qualquer ser humano – sublinho: QUALQUER ser humano tem dentro de si inúmeras coisas para expressar. Sonhos. Emoções. Pensamentos. Receios. Ansiedades. Ideias. E através de elementos simples e de materiais simples e de técnicas ainda mais simples, pode descobrir todo um mundo interior, pleno de criatividade e autenticidade.


Neste âmbito, garanto pessoalmente que nada há a temer.

O medo da tela em branco é, de facto, um grande, um enorme mito sem ligação à realidade.



. Medo 3. Medo de não ser especial


Aqui existe uma camada um pouco mais profunda da personalidade. O que está em causa é uma baixa auto- estima, que é reforçada negativamente pela noção intuitiva de que nada há de especial na existência desse adulto, que possa diferenciá-lo e trazer algo de especial à obra que se vai tentar fazer. Não só há o receio pelo fraco conhecimento técnico do processo artístico, como, a juntar a esta pré- consciência, teme-se – e muito – que os sentimentos a expressar não estejam à altura do que os espectadores esperam dele. É, no fundo, uma profecia que se auto- cumpre: “- Eu não tenho alma de artista, logo, nunca poderei criar uma obra de arte”.


Ora, ambas as ideias são falsas, e eu vou prová-lo com uma célebre citação do essencial performer e professor Joseph Beuys:


“- Eu só poderei ser considerado um artista se considerarmos que todos os seres humanos, sem excepção, são artistas” - J. Beuys


Pois bem, sabem que mais ? Ele tinha razão. Beuys era artista porque, sim, todos nós, sem excepção, somos artistas. E não o afirmo porque acredito sem hesitar nesta ideia: afirmo-o porque tem sido essa a minha experiência enquanto formador de arte.

Dê-se asas à imaginação do adulto que ele, sem qualquer dúvida, irá voar perante os nossos atónitos olhos.


Não é um sonho – é o que realmente tenho visto acontecer…



. Medo 4. Medo porque a escrita é o seu mundo; não a imagem


Este é um verdadeiro problema – que muitos adultos não conseguem nunca ultrapassar, infelizmente. Apesar de o mundo da imagem existir historicamente antes do discurso mais tradicional e racional das palavras, a invenção da escrita marca, para o bem e para o mal, o início da História humana e o fim do período pré- Histórico.


Ora, o que poderia ser um ganho para a humanidade – e é-o em muitos aspectos, sem dúvida (desde a divulgação generalizada do conhecimento às populações ao registo da cultura e pensamento científico) – é igualmente um enorme retrocesso. Estou a falar do retrocesso no processo artístico puro, no desenvolvimento da imaginação, na criatividade ligada à subjectividade da imagem.


Com a escrita, com os livros, o discurso - o pensamento torna-se aparentemente mais racional, mas perde-se talvez o essencial: a ligação às emoções do ser humano primitivo em conexão directa com a natureza ameaçadora e as suas respostas intuitivas perante essa premente ameaça. Nega-se, portanto, o acesso ao medo primordial pela sua transposição para o discurso racionalizante: o adulto encontra aqui a barreira emotiva perfeita.


E quando a arte – pela sua ligação a uma interpretação subjectiva e pela sua liberdade intrínseca – atira esse mesmo adulto de novo para os seus medos originais, ele – obviamente – recua, pois não é este o seu mundo referencial.


É uma atitude natural – mas não a devemos aceitar só por isso; antes a devemos contrariar sempre que possível.



. Medo 5. Medo de ser gozado por outro adulto; mas muito mais medo de ser gozado por uma criança


Este será, muito provavelmente, o receio que ressoa mais profundamente na alma do adulto. Mas… porquê ? A resposta é efectivamente fácil; não significa isto que é óbvia, mas é relativamente fácil de entender. Tem tudo a ver com o crescimento, desde a infância, à adolescência, ao estado adulto. Por todas estas fases de crescimento, algo se perde; e o que se perde é, como muitos adultos reconhecem (e aqui o fazem de forma muito, muito intuitiva) – a alma e a ingenuidade da criança.


E talvez por isso, o adulto, ao pegar num pincel, sente o seu pior receio na pele: que um outro adulto critique, até é natural; mas ele relativiza pois está entre pares – também o adulto que o critica tem a mesma dificuldade em expressar-se artisticamente. A mesma forma de ver o mundo – nada de novo aqui.


Mas o problema é quando surge em cena uma criança. A criança é o Joker, o Bobo da corte, que diz a verdade brincando com as ideias. E o adulto não suporta isso porque reconhece nela a espontaneidade que foi perdendo ao longo da vida, e a capacidade de brincar e relativizar aquilo que um adulto toma como sério e importante. Puro ciúme, está visto…


Concluindo – entra no jogo ! Sê uma criança, de novo ! Em arte não há medos – existem simplesmente possíveis caminhos e algumas aparentes e parciais soluções.


Porque, como dizia Pablo Picasso:


“- Se sobes a uma escada sabendo que não vais saltar para o outro lado – porque sobes a escada, então ? Se já sabes que não vais arriscar e tentar ver o que está do outro lado, nem sequer subas a escada" - P. Picasso


Portanto… vamos lá subir a escada e saltar para o outro lado ! :-)


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